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RESUMOS DAS COMUNICAÇÕES.

A estética em Hegel sobre a arte dos sons: interpretação e performance artística

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Prof. Dr. ARRUDA, Ney Alves de (Doutor pela Universidad Pablo Olavide – Sevilha, Espanha; Docente da Universidade Federal de Mato Grosso; Leciona na Faculdade de Comunicação e Artes – UFMT)

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Georg Wilhelm Friedrich Hegel, um filósofo alemão que viveu a transição do século XVIII para o XIX. Interessante que veio a este mundo no ano de nascimento de Beethoven (1770) e falece desgraçadamente de cólera em 1831. Conheceu o triunfo de ser um professor universitário influente cuja filosofia repercutiu ainda em vida, tamanha a audiência de suas aulas na Universidade de Berlim. Dentre suas áreas de interesse epistemológico está a Estética como “filosofia das belas artes” (Hegel 2012: 19). Sim, Hegel pensou sobre a arte simbólica, tendo como uma de suas representantes a arquitetura egípcia, a arte clássica trazendo na escultura grega um exemplo e a arte romântica materializada pela pintura.

Mas Georg Wilhelm como cidadão na Europa de importantes compositores românticos como Franz Schubert preocupou-se também em meditar sobre a grande arte dos sons, a Música. Ao escrever sobre ela, se debruçou refletindo sobre fatores componentes característicos e integrantes como: ritmo, melodia e harmonia. Suas reflexões filosóficas seguem possuindo um frescor e vitalidade incríveis nesta centúria contemporânea.

Na empolgante oportunidade deste seminário acadêmico, como um recorte metodológico necessário gostaríamos de abordar alguns pensamentos sobre a análise estética hegeliana acerca da “Função Própria da Música”. Naquilo que Hegel denominou de “execução musical e a comunicação da alma consigo mesma” (Hegel 2012: 122) e a “execução, expressão da alma livre” (Hegel 2012: 123).

Pois bem, no primeiro quadrante objeto de nossas cogitações está a argumentação de Friedrich de que a “música tem por objetivo exprimir a interioridade subjetiva [...] deve assim tomar a forma de uma comunicação que nos é feita por uma pessoa viva” (Hegel 2012: 123). Claro: Hegel não conheceu o gramofone, nem o long-play. Suas experiências estéticas musicais eram as mais cristalinas, porque se davam ao vivo em concertos de câmara ou sinfônicos nos teatros das cidades onde trabalhou. Isso faz recordar que o maestro húngaro Sergei Celibidache já falecido, que foi titular da Filarmônica de Munique detestava gravar discos, dado o fato de que para ele a experiência de um concerto ao vivo não se comparava jamais a colocar um CD para tocar em casa. Com razão Hegel, acerca da “intimidade subjetiva” do ato de execução musical. Imaginem o Trio para piano, violino e violoncelo de Maurice Ravel (1912): a vivência estética impressionista desta obra somente se revela por completo no concerto camerístico ao vivo, quando a interioridade subjetiva do compositor francês vem à tona via da emoção dos músicos instrumentistas.

Na segunda quadra de nossa intervenção, para concluir provisoriamente sobre o tema, tem-se a “liberdade ilimitada no espetáculo” e a “facilidade em dominar seu instrumento” (Hegel 2012: 123).  O filósofo nos ilustra com a ideia estética da performance. Ou seja, o momento do ato musical no palco perante a plateia. O instrumentista atuando de cor ou lendo a partitura, num solo de uma Sonata de Bach ou num quarteto para cordas de Dmitri Shostakovich, deve colocar sua alma de artista na hermenêutica de época, no estilo do compositor transmitindo assim a vivificação de todas as sonoridades.


 

 

Sobre a paz - Kant e os decoloniais

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BARROS, João (PPPGICAL - UNILA)

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A partir dos argumentos kantianos, começaremos tratando das prováveis causas da guerra e das conseqüências nocivas dela provenientes. Passaremos então a falar de como a espécie humana alcança a paz e como é possível mantê-la. Serão abordados também os benefícios morais que advêm da paz, enfatizando a importância de uma constituição republicana para o pleno exercício da liberdade e progresso da cultura. Ademais, será enfatizado que uma constituição cosmopolita é essencial para regular as relações entre os Estados reunidos em uma federação de povos. Na segunda parte do texto, exporemos alguns argumentos de autores decoloniais. Veremos como Mignolo relaciona Modernidade e colonialidade, definindo esta como a lógica daquela. Para ele, a Modernidade trouxe guerra e genocídio aos povos colonizados, ao invés de paz. Ainda segundo ele, a própria identidade latino-americana foi forjada em detrimento de indígenas e negros. Junto a isso, Quijano considera que a raça foi o critério fundamental para entender as relações de dominação e exploração nas colônias. Isso nos daria margem para pensar a Modernidade de modo mais crítico e reconsiderar o pretenso desenvolvimento da liberdade racional aventada por Kant.
 

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DIREITOS HUMANOS E SOCIAIS EM KANT

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CASTRO, Ana Luiza Moro de (Mestranda em Filosofia Social pela UFMT)

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Como coloca Luigi Caranti em seu livro mais recente sobre a filosofia de Kant, vivemos um momento político de extrema complexidade e reestruturação política; um projeto filosófico de direitos humanos poderia, então, nos indicar a direção a seguir (CARANTI, 2017). Seria importante, nesse sentido, legitimar os direitos sociais dentro da própria lógica do Estado de Direito uma vez que esses, diferentemente do que ocorre com os direitos individuais e políticos, esses direitos sociais com frequência são os primeiros descartados e considerados meras normas programáticas em momentos de inseguridade econômica. Considerando que a filosofia kantiana serviu de modelo para instituições como a ONU e para a positivação dos direitos humanos depois da Segunda Guerra Mundial, tê-lo como ponto de partida para uma reestruturação dos direitos humanos talvez nos ajude a legitimá-los.

A posição de que direitos humanos são direitos meramente históricos, como é o caso de Norberto Bobbio que, em a Era dos Direitos, diz não ser mais crucial uma fonte teórica e filosófica para os direitos humanos justamente por serem afirmações históricas e, hoje, nos restaria ampliá-los e assegurá- los, nos parece perigosa e até mesmo ingênua, uma vez que depende de uma crença no progresso humano, na validade e eficácia de nosso rol atual de direitos humanos e na capacidade de nosso sistema internacional de organização entre Estados ser capaz de ampliá-los.

Sabemos, entretanto, que esses direitos podem ser rapidamente perdidos e que a humanidade não necessariamente move-se em direção a um progresso inexorável. Por isso seria conveniente pensar em uma justificação filosófica para os direitos humanos, que, então, não dependeriam apenas de condições e momentos históricos, e que talvez pudessem ter alguma legitimidade em todos os tempos.

Que direito à igualdade em Kant se relaciona com o direito de igual liberdade, que se traduziria, em um primeiro momento, somente em direitos políticos e individuais, que exigem uma inércia estatal, já é sabido. Com base nos trabalhos de Allen Wood, Luigi Caranti e Heiner Bielefeldt, investigaremos, portanto, se seria possível que a filosofia de Kant abrangesse também aquela liberdade que depende de uma ação estatal e que está presente nos direitos sociais e econômicos.

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Formação da arquitetônica dos conceitos na Dialética de 1811

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CORTAT DE PAULA, Pedro Henrique Almeida (Mestrando - UFJF)

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A arte dialética é definida por Schleiermacher desde as notas de 1811 como investigação dos princípios da arte do filosofar, ou enquanto inquirição acerca dos princípios do saber. Segundo FRANK (2005) a origem é platônica, no termo διαλέγεσθαι, entendido como "a arte do diálogo no puro pensar". Por pensar puro Schleiermacher entende aquele desinteressado de motivos estéticos, ou políticos, mas orientado apenas para a verdade. Um pensar orientado pela verdade propõe-se não mero pensar, mas sim uma forma de Saber. Abre-se, portanto, a questão de como se dá a distinção entre Saber e Pensar para a dialética de Schleiermacher. Uma vez que esta, enquanto teoria formal do conhecer, servirá de fundamento das demais ciências será necessário, portanto, dar conta não só do Pensar, mas dos modos de se relacionar com o Ser que a consciência finita tem acesso. O saber passa sempre por um elemento material, parte de um perceber sensível. Schleiermacher defende explicitamente a identidade entre Saber e Ser, este pode ser assumido como um aspecto central de sua dialética. Contudo, esse voltar-se para fora do conhecimento só faz sentido se houver também uma arquitetônica dos conhecimentos na qual possa-se organizar o elemento material. Por isso, para esclarecer a possibilidade do conhecimento é necessário nos dedicaremos a teoria do conhecimento que aponta como ponto de intersecção entre pensar e saber a formulação de juízos e conceitos, pelos quais se dará a fundamentação de sua metafísica do Ser. Logo, nosso interesse neste trabalho será a exposição das relações entre pensar e saber na consolidação dessa tese da identidade entre Conhecer e Ser, a parte transcendental de sua dialética. Especificamente a formação dos conceitos, e como estes se relacionam com os juízos. Devido a natureza fragmentária da obra de Schleiermacher será tomado como base para nosso estudo as notas de 1811, texto o qual temos acesso direto. Contudo mobilizaremos comentadores de modo a nos fornecer aparato crítico de comparação das teses ali presentes com as demais edições da Dialética de Schleiermacher.
 

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A Ciência da Lógica de Hegel: sobre uma hipótese categorial

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Prof. Dr. COSTA, Paulo Sérgio de Jesus (UFSM)

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O trabalho versa sobre a hipótese de considerar a phantasia/imaginação como categoria no âmbito da Ciência da Lógica. Utilizo Dostoiévski nessa tarefa. Paralelamente à categoria de intersubjetividade proposta por Vittorio Hösle, fica claro que para pensar o conceito hegeliano de conciliação, em seus diversos níveis, ex. Filosofia do Direito etc., é necessário algo mais. Mas é, sobretudo, quando considera-se a superação do niilismo, na perspectiva hegeliana, que faz-se necessário aprofundar a temática do imaginário. Com esse propósito, a discussão sobre o realismo num sentido superior vem suprir um possível déficit da ideia de sistema lógico em Hegel. 

A imprescindível contribuição de Yuri Kariakin, junto com a interpretação de Hösle da contradição, será o caminho de defesa de nossa hipótese.  Lauth já defendera a proximidade do niilismo de Os Demônios de Dostoiévski em relação ao tratamento dado ao tema por Jacobi, numa discussão sobre Fichte. Kariakin, através da figura do cogumelo atômico, parece sugerir um novo tipo de Stavrogin. para caracterizar sua leitura contemporânea do autor russo. Os personagens niilistas russos, em uma  interpretação hegeliana, são conduzidos para além de si, para a positividade. Não há subsolo eterno...Os personagens ficcionais são momentos dialéticos. A categoria de phantasia/imaginação deve ser lida como necessária para a habitar o negativo, sem sucumbir a ele. 

A resposta hegeliana ao niilismo nessa interpretação dissolve o subsolo (podpolia), através da mobilidade dialética. A escuridão unilateral do momento abissal não é definitiva. O conto O Sonho de um Homem Ridículo (na animação do A. Petrov) é especialmente interessante para defender este argumento. Uma leitura hegeliana diria que a visão da verdade (istina) do homem ridículo veio através da negatividade que dissolve a hipérbole da finitude, nesse caso a afirmação do desejo de suicídio, conduzindo-o à conciliação. A ideia absoluta no final da Ciência da Lógica também aponta nesse sentido. 

Já na Fenomenologia do Espírito, a phantasia/imaginação está presente, referida "implicitamente" (há ainda poucos estudos nessa direção, ex. Jennifer Ann Bates, Hegel`s Theory of Imagination).  Nesse sentido, será fundamental voltar à Doutrina da Ciência de Fichte, além das razões aludidas por Hösle, para ler Hegel. Sobretudo para enfatizar a importância da imaginação produtiva “fantástica” no contexto do uma hermenêutica do niilismo e de sua superação. 

 

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A dedução metafísica das categorias tendo a dedução transcendental como ponto de partida


LIMA, Pablo Giorgio Costa de Sousa (Bacharel em Direito/Mestrando em filosofia na UFJF)

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Na medida em que partimos da Dedução Transcendental para uma análise dos resultados apresentados na circunscrição da, retrospectivamente denominada, Dedução Metafísica, encontramos algumas dificuldades no que diz respeito ao estabelecimento de suas teses, quais sejam, o estabelecimento apriorístico das categorias e a concordância entre as tábuas das funções lógicas e das categorias. Entendemos que se quisermos seguir à risca o modelo proposto por Kant as dificuldades são intransponíveis, porém colocando a Dedução Transcendental como ponto de partida, essas dificuldades são suavizadas ainda que algumas dificuldades persistam.

No início do §9 da segunda secção da Dedução Metafísica, Kant afirma que irá formular uma tábua que parte da função do pensamento.  Essa função que é derivada e, ao mesmo tempo, se confunde com a forma do entendimento (na medida em que, se trata, na verdade, do modus operandi da unidade sintética originaria), é encontrada a partir da abstração de um juízo qualquer. Isso, por si só, deveria ter o condão de justificar que as funções do pensamento podem ser todas encontradas na medida em que há um número limitado de formas nos juízos. Partindo-se da Dedução Transcendental, entretanto, surgem-nos algumas outras questões concernentes a formulação da segunda tábua e a Dedução Metafísica das categorias.
E isto porque, dentre outros motivos, a dedução das categorias se assenta no fundamento racional pelo qual a síntese é estabelecida, o que implica, no nosso entender, que a tese da dedução metafísica só é de fato concluída na dedução transcendental, que, por sua vez, tem uma tese própria para ser resolvida (qual seja a da necessidade das categorias no que diz respeito ao seu uso no que diz respeito ao conhecimento).

Ora, é usando a justificação de um conceito ainda incompleto na Dedução Metafísica, qual seja, a de unidade sintética, que Kant justifica o estabelecimento das categorias. Mas essas categorias, na verdade, só são possíveis através de um Eu formal responsável por essa unidade sintética, qual seja, a apercepção originária que envolve o Eu penso que acompanha todas essas representações advindas de diferentes fontes do conhecimento. Sem esse dado, é inviável se estabelecer conceitos puros do entendimento, na medida em que não saberíamos se estamos, de fato, conscientes de nossas representações, incluindo nesse rol as representações de tempo e espaço, para que possamos conhecer nossos conceitos puros, já que só temos representações na medida em que as faculdades superiores da razão (entendimento e sensibilidade) se unem através de uma síntese necessária. Isso quer dizer, ao que nos parece, que as categorias são estabelecidas antecipadamente a uma justificação convincente.

Sendo assim, iremos questionar se, diante do estabelecido (antecipadamente), esses conceitos foram, de fato, colhidos sistematicamente diante de um princípio, ou se, no final das contas, Kant não avançara, na Dedução Metafísica das categorias ao menos, o projeto de Aristóteles de maneira necessária, ainda que ele insista que a tábua das categorias se trata de todo o entendimento em seu formato original, ou seja, puro, na medida em que ela é formada por esses conceitos que, supostamente, em nada estão misturados com quaisquer dados da experiência.
 

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A DEFINIÇÃO KANTIANA DE TEMPO É UM CONCEITO VULGAR? UMA BREVE ANÁLISE DA INTERPRETAÇÃO HEIDEGGERIANA DE KANT

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MENDES, Eric Ewans (Mestre em Filosofia Social pela UFMT)

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Em sua interpretação da Crítica da Razão Pura, o jovem Heidegger observou a compreensão kantiana sobre o tempo. Tal compreensão apresenta o tempo como um constitutivo da estética transcendental, o qual juntamente com o espaço é um dado a priori, uma intuição pura que possui suas características positivas e negativas. O tempo é a forma do sentido interno e da intuição humana bem como do seu estado interior, é a condição formal a priori de todos os fenômenos em geral, imediatamente em relação aos fenômenos internos da alma e mediatamente aos fenômenos externos. Dessa maneira, o tempo tem sua precedência sobre o espaço como uma intuição pura universal, como elemento essencial e suporte de cognição pura, pela qual o sujeito é ocupado mais primordialmente do que pelo espaço. Heidegger afirma que Kant compreendeu a questão do tempo como um problema ontológico fundamental e reconhece que o filósofo de Königsberg em sua investigação direcionou-se para a dimensão do problema da temporialidade / temporalidade do ser em geral (Temporalität), o que faz dele um dos filósofos modernos que, segundo o jovem Heidegger, empreendeu uma das mais importantes investigações sobre a temática do tempo, por ter ido além do que Aristóteles já havia tratado em relação ao problema, mas, ao mesmo tempo, é possível notar que ele tem como base fundamental o conceito aristotélico de tempo, o que permite compreender que assim como Aristóteles e seus antecessores, Kant também parte do conceito vulgar de tempo em direção ao seu caráter mais originário. Porém, como acusa Heidegger, Kant também acaba caindo no mesmo erro da tradição filosófica, e assim afastando-se do conceito de tempo originário. Um dos fatores que indicam tal erro está em sua análise sobre o si-mesmo. Ele entendeu o eu como a realidade do Res Cogitans descartiano, o eu como sujeito subsistente, e não como ser-do-si-mesmo qua si-mesmo, apreendido existenciariamente no poder ser-si-mesmo próprio, na propriedade do Dasein como cuidado em relação a sua temporalidade (Zeitlichkeit), isto é, sua própria existência. Portanto, a proposta desta pesquisa tem uma tarefa dupla: primeiro, compreender a interpretação que Heidegger faz do conceito kantiano de tempo e apresentar de maneira breve, os erros cometidos por Kant em sua investigação, conforme acusa o autor de Ser e Tempo, que levaram o filósofo moderno a elaborar um conceito vulgar de tempo. 
 

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A AUTONOMIA DA VONTADE NA FUNDAMENTAÇÃO DA METAFÍSICA DOS COSTUMES 

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NASCIMENTO, Julia Stephanie Abrão Seidl do (Mestranda, PPGF-UFMT) 

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A presente comunicação propõe-se a discorrer acerca da noção de autonomia da vontade da obra Fundamentação da Metafísica dos Costumes, de Immanuel Kant (1724 – 1804). Sua filosofia prática consiste em buscar um princípio a priori, proveniente da razão pura, o que orienta as ações para um agir moral. Este agir moral chama-se dever e precisa alinhar-se com a lei moral não somente exteriormente, mas interiormente, que realiza-se pelo respeito a uma lei moral, sem intenção alguma de satisfazer móbeis empíricos. Num processo de averiguação, o imperativo categórico nos possibilita testar uma ação, julgando e universalizando as máximas da ação, demonstrando seu princípio ético com a fórmula da humanidade e da lei universal. A autonomia da vontade demonstra a capacidade de um ser racional legislar por si mesmo, ao mesmo tempo que seguimos tal lei, que é válida universalmente e todos os seres racionais são dotados dela. Este conceito é essencial, pois fundamenta toda a sua filosofia prática, visto que ela é a chave para entender a compreensão da moralidade, que abrange nossas ações e a maneira que devemos agir conosco e com os outros. O conceito de autonomia firma-se em duas características principais: a primeira caracteriza-se pela moralidade como exigência e característica auto impostas, enquanto a segunda consiste na capacidade que possuímos da autogovernação, isto é, o domínio sobre nós mesmos. Sua possibilidade demonstra a capacidade de sermos livres, o que nos diferencia de outros seres que apenas agem segundo as leis e não segundo suas representações, conciliando a possibilidade de sermos livres com a obediência a lei moral. Ao apresentar um princípio que é puro e autêntico revoluciona a discussão atual, tornando-a pertinente até hoje ao questionar se estamos ou não limitados por algum princípio moral, proporcionando diversas interpretações que até os dias de hoje são pertinentes na ética contemporânea.
 

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A construção ienense do monismo hegeliano 

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OLIVEIRA, Luiz Filipe da Silva (Doutorando em Filosofia na UFRGS)

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Aceitando que toda doutrina monista deva conter como base três formas reguladoras, a saber, 1) a forma como o princípio do sistema é entendido, ou como a unidade da totalidade é concebida; 2) como se articula a forma lógica conceitual da finitude frente esta totalidade; e 3) e a estrutura do sistema através do qual se funda e se desenvolve a posição monista, pretendemos apresentar o caminho que Hegel percorre em Jena rumo a apresentação da versão mais acabada de sua ontologia na Fenomenologia do Espírito de 1807 (HENRICH, 1980, p. 104). Visando apresentar a estrutura monista que regia as relações entre o Absoluto e a finitude, apresentaremos de início a concepção hegeliana com base em suas produções datadas de 1801/02, mais específicamente a Differenzschrift, e em Logica et Metaphysica. Acreditamos que nesse período prevalecia uma concepção onde o Absoluto era visto sob a ótica de uma metafísica da substância, a forma conceitual como sendo primariamente impulsionada pelo próprio Absoluto e a forma de sistema de modo a se distinguir Lógica e Metafísica em disciplinas separadas. É notório a partir de 1802/03 o aparecimento de termos como “o outro de si mesmo” e “alteridade” em textos como o Naturrechtsaufsatz e o System der Sittlichkeit. Isso explicita uma mudança fundamental no pensamento hegeliano em relação a sua concepção anterior, ou seja, que a forma conceitual não era vista a partir da relação negativa do Absoluto para com a finitude, ou seja, o Absoluto motivando o processo dialético, mas sim que esse processo é concebido na própria finitude. No entanto, permanecia ainda uma distinção entre o que deveria ser negado e a realização do princípio monista. Melhor dizendo, nessa fase permanece ainda uma noção onde o conhecimento do Absoluto é concebido segundo o modelo empírico consciência-objeto prevalecendo uma sequência de etapas, através das quais o sujeito alcança um conhecimento cada vez mais rico do Absoluto (SCHALHORN, 2004, pp. 174-176). Vai ser a partir de 1804/05 no Systementwurf II que as relações de alteridade, ou seja, que a autossuspensão da finitude vai ser pensada como o próprio Absoluto. O conhecimento do Absoluto não é mais pensado analogamente ao conhecimento do objeto, mas como autoconhecimento do sujeito. Isso além de transformar a forma lógica conceitual alterava também a forma como a forma de princípio era entendida, ou seja, houve a mudança de uma metafísica da substância para uma metafísica da subjetividade. Não por acaso, Henrich (1980, p. 118) afirma que “a teoria do Absoluto como Espírito se encontra pela primeira vez plenamente desenvolvida na Lógica e Metafísica de 1804/05”. Não obstante, permanecia uma ambiguidade no que diz respeito a forma de sistema, isto é, contrariamente à intenção original de Hegel, a configuração de ambas as disciplinas propostas no Systementwurf II deixava claro que elas não eram nem metodologicamente nem substantivamente separadas (JAESCHKE, 2016, p. 154). A unificação destas só viria ser conscientemente apresentada na Fenomenologia. 
 

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A categoria “trabalho” em Hegel e Lukács: notas introdutórias

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PAIXÃO, Bruno Gonçalves da (Doutorando em Filosofia pelo PPGFil /UNIOESTE)

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A proposta dessa comunicação é tentar mostrar como a categoria do trabalho aparece em G.W. Hegel e G. Lukács, especialmente na Filosofia do Direito e na Ontologia do Ser Social, respectivamente, e com isso possibilitar identificar, ou não, o papel formador da supracitada categoria no desenvolvimento do ser social. Vale o alerta, antes de tudo, que o objetivo aqui não é algo que frequentemente comparece em textos de linha marxista, a saber, o de tentar marxianizar (nesse caso, obviamente não por Marx, mas por um marxista: Lukács) Hegel, muito menos hegelianizar Lukács. Não é nenhuma novidade que o marxismo é devedor da filosofia hegeliana. Mas, por outro lado, o marxismo também se elevou como filosofia própria, original, que não obstante opera com assimilações e afastamentos, em larga medida, da filosofia hegeliana. Com o trabalho essa relação (absorver e avançar) parece ganhar um colorido especial com Lukács. Porém, ao contrário dos estudos vinculados ao filósofo húngaro, onde as pesquisas concentraram-se principalmente no capítulo primeiro, volume II, de sua ontologia - o que trata propriamente do trabalho - em Hegel nos parece que é um tema pouco trabalhado de forma autônoma. Nesse último o trabalho geralmente é aludido pela necessidade de tratar dos momentos da segunda seção, por exemplo, da Eticidade, muitas vezes passando despercebido ou quando muito, pois tratado de forma aligeirada, entendido de modo meramente economicista. Mas será que o trabalho em Hegel teria um papel para além de um momento mediador com vistas a suprir as necessidades imediatas dos homens, ou seja, que ultrapasse o elemento eminentemente econômico? Ou sua função serviu como germe da tese posteriormente desenvolvida, - marxiana-lukácsiana-, do papel transformador não só da natureza, mas também da consciência do novo tipo de ser? A pergunta só faz sentido porque - e aqui já entra uma diferenciação no trato das duas categorias – em Hegel, ao contrário de Lukács, o que funda o mundo dos homens é a razão, enquanto que para o filósofo magiar, o trabalho seria a categoria fundante do ser social. Obviamente, com esse pressuposto diferente, em larga medida, as saídas encontradas nas duas filosofias, no final das contas, se contrapõem; vide a tese do Estado como momento necessário e superior da eticidade em Hegel e a superfluidade dessa mesma forma política para uma sociedade humanamente emancipada, em Lukács. Mas todo cuidado aqui é pouco. Essa contraposição não pode ser entendida de forma simplista e dualista (um idealista x um materialista). Poderíamos dizer que existe uma inversão na concepção da categoria fundante, porém, as duas filosofias se cruzam em certos pontos do caminho. E é essa relação de contraposição e entrecruzamento que dará a tônica dessa exposição, no intuito de verificar o papel (função social) da categoria trabalho em Hegel e Lukács. 
 

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Esclarecimento e antissemitismo: reflexões sobre o significado do judaísmo para Berthold Auerbach 

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PERSCH, Danilo (Prof. na Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT)

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“O que é esclarecimento?” perguntou o filósofo alemão Immanuel Kant em 1784, ao que respondeu da seguinte forma: “É a saída do homem de sua minoridade, pela qual ele próprio é responsável”. Se por um lado esse enunciado enfatiza a luta contra a minoridade há também, por outro lado, a insistência em favor da promoção, da autonomia e do fortalecimento da razão, o que significa a libertação dos indivíduos em geral de todas as formas de irracionalismos, dos fanatismos religiosos, dos mitos e das superstições. Sob esta perspectiva, um dos principais empreendimentos de Kant, bem como dos demais filósofos iluministas, consistia na promoção e propagação da igualdade entre as pessoas, independente da sua raça, cor, religião etc. Há, no entanto, o que se pode considerar como lado sombrio e misterioso do esclarecimento, ou seja, vários pensadores iluministas tais como Kant, Fichte, Hegel e outros, não hesitaram em discriminar, ao menos teoricamente, grupos minoritários, a exemplo dos judeus. É com base nessas considerações gerais que se pretende apresentar um texto nesse “II Seminário de Filosofia Clássica Alemã”, originado a partir de leituras e discussões de algumas obras do filósofo, literato e poeta alemão (de descendência judaica) Berthold Auerbach (1812 – 1882). Como se trata de um pensador ainda pouco recepcionado no âmbito da academia brasileira, dar-se-á espaço, num primeiro momento, para uma breve apresentação biográfica de Auerbach, com algumas referências às diferentes etapas da sua vasta produção filosófica, literária e poética. Feitas essas considerações introdutórias, pretende-se então explorar mais detalhadamente a forma como esse pensador judeu-alemão tem convivido com o problema do antissemitismo, sendo ele próprio vítima da crescente onda de discriminação dos judeus na Alemanha, durante o século XIX. Por fim, pretende-se demonstrar que a discriminação sofrida por Auerbach desde sua infância, não lhe roubaram a crença na possibilidade de uma convivência pacífica entre judeus e alemães, esperança que ele manteve até o fim da sua vida. 
 

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O problema da inadequação entre forma e conteúdo nos sistemas de Fichte e de Schopenhauer


UCHÔAS, Pedro Damasceno (Mestrado em Filosofia pela Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF)
    

No primeiro prefácio de O mundo como vontade e como representação (1819) Arthur Schopenhauer adverte sobre as principais exigências para a correta leitura de sua obra. A primeira mencionada é a maneira como seu livro deve ser lido, a solicitação de um modo específico de compreendê-lo. Segundo ele, o que a obra em sua totalidade comunica é um único pensamento (einziger Gedanke) e cada uma de suas divisões (filosofia do conhecimento, metafísica da natureza, estética e ética) deve ser dependente da compreensão tanto das partes anteriores quanto das posteriores. Desse modo, seu pensamento faz-se entender apenas quando o leitor o compreende primeiro em sua totalidade e posteriormente em suas divisões, de acordo com o que a ordem das explicações e as respectivas divisões de temas nada são senão um meio para sua comunicação, diferenciando o conteúdo (Inhalt) a ser comunicado de sua forma. Sua filosofia é construída, nas palavras do autor, através de um encadeamento "orgânico". O exato oposto a esse modo de comunicação seria o que denomina "Sistema de pensamentos", o sistema que se funda sobre um único princípio e dele deriva o restante do pensamento. Todavia, a formulação escrita por Schopenhauer não é de todo desconhecida na filosofia de seu tempo e nem sequer o primeiro sistema a expor uma estrutura desse tipo. Fichte, em A doutrina da ciência e o saber absoluto, apresenta de maneira similar a inadequação entre conteúdo e forma no que concerne ao saber absoluto e à exposição dele, segundo o que afirma que a diversidade do texto e os seus momentos seriam ocasionadas pela necessidade de organização do conteúdo da intuição do saber universal e de sua apresentação ao leitor na forma de um escrito, de maneira que a plena compreensão de tal conceito só se daria em uma leitura completa, no momento da intelecção da "única visão clara que unifica o diverso e difunde o uno em um diverso" (FICHTE, 1980, p. 259). De acordo com essa consideração, Fichte afirma que a Doutrina-da-ciência deve ser compreendida como um sistema de uma única intuição, contraposto, assim como em Schopenhauer, à filosofia como "Sistema de pensamentos". Desse modo, esta comunicação tem como objetivo principal, levando-se em consideração os diferentes conteúdos tratados por cada autor em suas obras, a exposição das noções de único pensamento em Schopenhauer e de única intuição em Fichte no que diz respeito à relação entre forma e conteúdo no interior de seus respectivos sistemas filosóficos, problematizada por ambos de maneira similar.
 

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